Wednesday, December 25, 2013

Feliz Natal pra todos, feliz Natal!!

Sempre gostei de contar histórias!

Foi em 2005, novembro. Acho que era uma sexta-feira. Já tínhamos luzes de Natal!

Passadas cerca de duas horas naquela loja de brinquedos - onde brincamos com cada brinquedo que chamou a atenção de nossa pequena aniversariante, decidimos qual seria o primeiro presente de aniversário, do primeiro aniversário de nossa primeira filha. Era um fim de tarde e estávamos provando algo novo, e ímpar: entrar em uma loja de brinquedos como pais e não mais como filhos. O poder de escolher e comprar, e não mais a espera de que fosse comprado o que queríamos. Creio que brincamos mais do que nossa filha, e por fim, decidimos comprar uma piscina inflável, dessas que a gente enche de bolinhas e as crianças adoram entrar e jogar tudo pra fora - nos custou algo em torno de 80 Reais!

Éramos "Os pais" que compram presentes pros filhos, e não mais "Os filhos" que esperam presentes dos pais!

Quando saímos, o dia nem era claro demais pra ser ainda dia, nem escuro o bastante pra que já fosse noite. As imagens dos prédios em frente, os carros que se aglomeravam no farol da Veiga Filho com Albuquerque Lins, a pouca luz, aquela caixa enorme na parte debaixo do carrinho de bebê, o nosso bebê sentado em seu carrinho... ...tudo reforçava a idéia de autonomia e segurança que sentíamos no então papel - ainda recente - de pais. Durante um intervalo de alguns segundos, uns poucos passos na pequena rampa que separa a porta da loja e a calçada, tudo parecia extremamente sólido... ...até ser completamente quebrado no instante seguinte... ...mais uns poucos segundos... ...uma sequência de imagens corriqueiras.

Na porta da loja de brinquedos, ao lado de uma pilha de caixas de papelão, o gerente da loja autorizava um garoto - que pela estatura não parecia ter mais do que uns dez anos de idade - a pegar aquele papelão todo. Por mais que fosse demais para ele, ele abraçou uma grande quantidade e meio torto e curvo cruzou minha frente para colocá-los em uma pequena carriola - dessas iguais a carroças puxadas por burros, mas adaptada pra ser puxada por um... ...menino.

Ele esperou que passássemos para continuar a carregar as caixas... ...nós passamos por ele com nossa caixa e nossa vida. Me lembro de ter grunido alguma coisa sem graça com meu sorriso sem graça enquanto olhava seu rosto mas ele não se deu conta de que era com ele. Nos passos seguintes, pensei em voltar e ajudar a carregar as caixas, ou entrar na loja e pedir pra que ele escolhesse um brinquedo, ou levá-lo pra comer alguma coisa ou... 
   ...me lembro de em silêncio ter me colocar a dúvida de estar pensando em alternativas pra minimizar o sofrimento daquele garoto, ou minimizar o meu! Me lembro de ainda ter me voltado e ver o garoto puxar a carriola rua acima, com a força de sua tração.

Ao dobrar a esquina conversei sobre isso com Leila: sobre sermos pais, sobre o garoto, sobre nossa garotinha, sobre nossa caixa...

...a partir desse ponto de minha vida, as luzes de natal me lembram esse garoto...

...essa é a minha lembrança de Natal!

...acho que era uma sexta-feira... ...talvez sábado!


Estávamos muito felizes!


Sempre gostei de contar histórias!




Montréal - 21 de Dezembro de 2010





Thursday, November 14, 2013

Duas vezes 99

Vivemos em um mundo pobre.
Mundo que me mostra a todo instante que
Nesse mundo não existo.

Onde existe beleza, o que se vê é um corpo.
Onde existe espírito, o que se vê é religião.
Onde existe vida, o que se vê é o dinheiro.
Onde existe voz, o que se vê são vitrines quebradas.
Onde existe histórias, o que se vê são rugas.
Onde existe sonho, o que se vê são piadas.
Onde existe paixão, o que se vê são corações partidos!

Nesse mundo de pobrezas sóbrias, não: eu não existo.
Não sou mais do que um corpo ateu.
Mais um punhado de pouco dinheiro,
uma vitrine quebrada,
umas tantas rugas
- uma piada.
Nada mais do que um coração partido!

E o mundo que me define não se engana nem no fato, nem na proporção.
Mas não é por não existir para o mundo, que deixo de existir pra mim mesmo.

Em minha 'não-existência'
eu sou um corpo buscando a beleza.
Sou um ateu buscando o espírito.
Um monte de dinheiro buscando o que seja a vida.
Uma vitrine quebrada que busca a coragem da pedra.
Sou as rugas que buscam a intensidade de suas histórias.
A piada que nunca vai deixar de buscar o sonho.
Sou a lágrima que não vive sem paixão!

Por 99 vezes me encontrei perdido nesse mundo,
...e por outras 99 vou buscar esse caminho.
Pois em fato e proporção eu não existo nesse mundo.
Eu só existo nessa busca.
          
...é nessa busca tenho o lugar onde eu sempre vou me encontrar!



(outras 2 vezes 99 vezes se preciso for!)






Sunday, November 3, 2013

O Passageiro

O destino do Passageiro é o exílio
Sempre foi… …(mas não é o seu destino compreender)

O exílio de todos os lugares
Não existe lugar para o Passageiro
Mas existem pessoas… …ah sim, existem muitas pessoas
…existem muitas pessoas… …que passam
E a maioria delas não sabe disso
Pelo menos não sabem à tempo de poderem tocar o que passa!

Mas o Passageiro, que não possui lugares
(e já não busca lugares)
Ele toca as pessoas.
Algumas por um instante, algumas por toda vida
E por todas elas é conduzido
O Passageiro jamais conduz
E tanto as pessoas quanto os lugares não sabem disso…
…é incrível: eles não sabem!
E sempre foi assim!

Todas as viagens são longas
E todos os caminhos diferentes, mesmo os caminhos de volta
…o Passageiro sabe que não existe volta!
Talvez seja isso que sua alma procura
E certamente isso é o que ela nunca vai encontrar!

A esperança do novo lugar é imensa e viva
Mas é na dor do exílio que ele se reconhece
…já faz tempo demais, e é de sua natureza
O exílio de todos os lugares
O exílio de todas as pessoas
E o tempo que concorda com tudo isso
(ele é o único que acompanha o Passageiro;
   sempre singelo, cruel e sempre, sempre sorridente)

O Passageiro fala muitos idiomas
Mas nenhum é compreendido pelos Homens
Por isso ele toca as pessoas
         por um pouco de alimento, pra matar a sede, pra se esconder do frio
Algumas por instantes, outras por toda vida
O tempo é o único que acompanha o Passageiro
E permite que o passado possa ser lido em seus olhos
Mas as pessoas não falam esse idioma
E não olham, não sabem, e não entendem seus olhos
…e a maioria delas não sabe disso
E sempre foi assim!

Mas o Passageiro sabe onde fica a porta de entrada
E sempre se emociona ao contemplar a paisagem…
…as paisagens do tempo passado
   que nunca são as mesmas
   porque não existe caminho de volta!
O Passageiro conhece o futuro
Porque o destino do Passageiro é o exílio
e sempre foi assim!!!


(Montréal, 30 de julho de 2008)

Tuesday, October 29, 2013

Quando não se quer mais ir adiante

Quando não se quer mais ir adiante
O futuro é humano
E o presente, um brinde à beira do abismo

O passado é vivo
Se disfarça de tapete vermelho
...não desbota... ...não se afasta...
        
Tenho meus pés como raízes
Se alimentam do solo por onde passam
Esmagando o dia-a-dia
                                    vivo e radiante
                                            em suas dores
                                                   em suas perdas
                                                          em suas mortes!

Quando não se quer mais ir adiante...
                                                                ...sorria...

Como se existisse algo
Como se existisse força
Como se existisse caminho!


Simplesmente sorria!!!



(Montréal - 14 de Dezembro de 2010)


Thursday, October 24, 2013

Pessoas Felizes!


Sinto falta de pessoas felizes!
Vejo pessoas cansadas
Pessoas distantes
Pessoas fúteis
Pessoas amargas
Pessoas velhas
Pessoas descrentes
ou crentes em demasia!
Pessoas que sentem remorços,
que devem dinheiro,
que não têm moral,
que não tem coragem
que se entregam aos vícios...

A felicidade é algo que gostaria de viver hoje,
pois hoje é o único lugar em que se pode ser feliz!

Hoje é o único tempo em que temos vida.
O ontem e o amanhã, são tempos que não existem!
E justamente hoje sinto falta!

Sinto falta da felicidade nas pessoas.
Como quem procura o calor do sol num dia cinzento
    sinto falta de pessoas que não dêem desculpas, 
    de pessoas que não dêem milhões de explicações!

Sinto falta de pessoas felizes!

Sinto falta de pessoas cansadas felizes
Pessoas distantes felizes
Pessoas fúteis felizes
Pessoas amargas felizes
Pessoas velhas felizes
Pessoas descrentes ou crentes demais que se sintam felizes
em sua crença ou na ausência dela!
Pessoas que sentem remorço mas são felizes
Pessoas que devem dinheiro e são felizes
Pessoas que não tem coragem e são felizes
Viciados... ...que nos momentos além do vício ao menos enxergam
e sentem, o que é estar feliz!

Não tive hoje um dia de sol e de pessoas reais que sabem o que é estar feliz
E justamente hoje, eu sinto que estou farto do Amanhã...
...apesar de ser quem sou, de saber o que sei, e seguir pra onde vou!

É irônico ao mesmo tempo, ser passageiro e caminhar sozinho!


(Montréal - 18 de Maio de 2009)




Monday, October 21, 2013

O Anjo e o Abismo

Por vezes durante a caminhada, os pés doem, e o corpo se curva...

À beira do abismo, onde se tem uma paisagem única,
o Passageiro vê alguém que se desespera.
É um anjo que está muito próximo do abismo...
...próximo demais para que possa voltar,
E ao mesmo tempo, desprovido de coragem para dar o passo adiante.

O Passageiro - por não ter medo e conhecer outras línguas
se aproxima, senta-se ao lado das lágrimas que caem
e encara com um sorriso, aquele que está perdido.

Uns tantos 'silêncios' mais tarde,
e um pouco mais confortado pela presença de um sorriso,
o Anjo senta-se ao lado do Passageiro e compartilha seus sentimentos.
Diz que perdera tudo o que conhecia, o que acreditava...
Sentia-se vazio e sozinho diante da imensidão do precipício...
...e sem qualquer apoio ou amparo diante da queda eminente!

O Passageiro após escutá-lo, confirma a visão do anjo:


“-Não existe de fato, porto seguro ou abraço seguro que possa nos acolher diante da vida!”

O medo e a insegurança voltam aos olhos do anjo
com um leve traço de ira por não ter ouvido aquilo que esperava...
                   ...aquilo que gostaria!

Com um afago no olhar e um sorriso de compreensão,
o Passageiro se despede, 
                                 se levanta,
                                                e cuidadosamente
desvia seus passos das asas do anjo


- o maior e mais lindo par de asas
que tinha visto na vida!

E então, segue seu caminho!

O Passageiro não tem asas!

Por vezes durante a caminhada, os pés doem, e o corpo se curva. E diante disso, existem aqueles que não enxergam,


e não acreditam naquilo que têm!





Friday, October 18, 2013

A inocência



E a inocência então partia!

Se inclinara lentamente enquanto eu caminhava e   
contemplava o despertar da lua,
e se foi em uma das curvas do caminho.


Não me lembro da última vez em que ela sorriu pra mim,
mas me lembro bem de seu sorriso 
- ás vezes ele me aquece 
e sem o menor sentido ou razão,
me faz sorrir,
e sentir saudades!...


...e me faz chorar do choro bom das lembranças
- as lembranças das histórias passadas.
Que são histórias passadas,
mas jamais histórias perdidas!

Eu não sou mais o mesmo,
assim como a lua hoje desperta em horizontes antes
nunca imaginados. 
Mas a inocência, ela é a mesma!
E às vezes me parece certo que essa é a mensagem:
   
ela se foi pra que pudesse continuar a mesma.
Se foi para que não fosse transformada!

Nas contradições de um sentimento
- como é da natureza dos sentimentos -
se foi porque só assim estaria sempre presente!

Às vezes quando a lembrança de seu sorriso me aquece, 
 me pego olhando pra trás e sorrindo come se fosse 
 reencontrá-la.

Nesses momentos, tenho a nítida impressão de que ela me  
 acompanha, e está escondida em algum lugar,
 me observando...
 ...e sorrindo,


como se soubesse que minhas buscas no futuro
nada mais são do que meu caminho de volta,
onde talvez ela esteja me esperando com seu sorriso
e um abraço
- daqueles abraços que dão sentido
à todas as buscas perdidas!



(à Mira Serena e Michel Albert)

Tuesday, October 15, 2013

"dEUs"


...e pensaram a vida...
...algo extremamente simples:
uma pequena caixa quadrada fechada boiando no oceano.
Ela é pequena mas grande o suficiente pra abrigar e conter o que aprendemos a chamar de vida.
Não é possível perceber que há algo do lado de fora, mas sentimos o movimento das marés... ...ora calmaria, ora tempestade!
Ali contida a vida poderá seguir seu curso até o fim de seus dias. Tudo é permitido... 
...inclusive olhar para cima...
...inclusive abrir a caixa e contemplar a imensidão do céu dentro da moldura quadrada da borda da caixa!
Não é preciso muito esforço para abrir a caixa, mas não são todas as vidas que aprendem ou decidem fazê-lo... ...afinal, tudo é permitido!
Tudo é permitido, até mesmo escalar as paredes da caixa e sentar-se em suas bordas, e descobrir o céu por inteiro...
...e descobrir o oceano...
...e oferecer uma outra dimensão à vida!
Descobrir que o céu não é uma imensidão contida numa moldura, mas é infinito.
Descobrir que o oceano é infinito como o céu, mas além disso, infinito em suas formas e no seu movimento que a cada segundo se reinventa numa nova composição que não será repetida jamais!
Entre eles, o horizonte.
Pra algumas vidas, uma fronteira...
                     ...pra outras, um beijo também infinito entre o céu e o mar!
Nesse momento, alguns - não todos - ainda descobrem um outro infinito, não visível mas não menos contemplável: o Tempo!
Sentado na borda da caixa é possível passar a vida inteira, encontrar a felicidade, ver sentido na existência humana, chorar, sorrir e viver em paz... ...pois tudo é permitido!
Tudo é permitido, até mesmo querer voar!
E existem vidas que querem...
                            ...existem vidas que se lançam ao ar...
                                                                                            ...existem vidas que voam,
                                                                                                                                e voam,
                                                                                                                                     e voam,
e tomam pra si a imensidão que o céu oferece!
Existem as vidas que se lançam ao ar, mas caem na água e se vêem absolutamente sós, com os cacos de seus sonhos diante de seu universo infinito interior.
... ... ... ... ...
...após o silêncio, algumas dessas vidas passam o resto de seus dias tentando voltar pra dentro da caixa!
Outras, aprendem a nadar e seguem o mais longe que puderem, descobrindo as marés e os novos movimentos do dia - que nunca se repetem!
Mas ainda algumas poucas, arriscam o mergulho,
                            e descobrem a imensidão infinita do fundo do mar!
                                      ...e descobrem um mundo novo e...
...e da forma mais difícil...
                                                                                             ...aprendem a voar, 

e voam, 




e voam, 




e voam!!!


O Ridículo, é o manto protetor do Passageiro.

Diante das questões indecifráveis sobre a vida, ele sempre repete aos que discutem:
“A vida é simples: 
ela é uma pequena caixa quadrada fechada boiando no oceano!”



“Mira Serena, você pode fazer um desenho pra mim?
Uma pequena caixa quadrada boiando no oceano. Você faz?

Imagem: Mira Serena - então com 6 anos.

Montréal - 25 de Maio de 2011