Thursday, November 14, 2013

Duas vezes 99

Vivemos em um mundo pobre.
Mundo que me mostra a todo instante que
Nesse mundo não existo.

Onde existe beleza, o que se vê é um corpo.
Onde existe espírito, o que se vê é religião.
Onde existe vida, o que se vê é o dinheiro.
Onde existe voz, o que se vê são vitrines quebradas.
Onde existe histórias, o que se vê são rugas.
Onde existe sonho, o que se vê são piadas.
Onde existe paixão, o que se vê são corações partidos!

Nesse mundo de pobrezas sóbrias, não: eu não existo.
Não sou mais do que um corpo ateu.
Mais um punhado de pouco dinheiro,
uma vitrine quebrada,
umas tantas rugas
- uma piada.
Nada mais do que um coração partido!

E o mundo que me define não se engana nem no fato, nem na proporção.
Mas não é por não existir para o mundo, que deixo de existir pra mim mesmo.

Em minha 'não-existência'
eu sou um corpo buscando a beleza.
Sou um ateu buscando o espírito.
Um monte de dinheiro buscando o que seja a vida.
Uma vitrine quebrada que busca a coragem da pedra.
Sou as rugas que buscam a intensidade de suas histórias.
A piada que nunca vai deixar de buscar o sonho.
Sou a lágrima que não vive sem paixão!

Por 99 vezes me encontrei perdido nesse mundo,
...e por outras 99 vou buscar esse caminho.
Pois em fato e proporção eu não existo nesse mundo.
Eu só existo nessa busca.
          
...é nessa busca tenho o lugar onde eu sempre vou me encontrar!



(outras 2 vezes 99 vezes se preciso for!)






Sunday, November 3, 2013

O Passageiro

O destino do Passageiro é o exílio
Sempre foi… …(mas não é o seu destino compreender)

O exílio de todos os lugares
Não existe lugar para o Passageiro
Mas existem pessoas… …ah sim, existem muitas pessoas
…existem muitas pessoas… …que passam
E a maioria delas não sabe disso
Pelo menos não sabem à tempo de poderem tocar o que passa!

Mas o Passageiro, que não possui lugares
(e já não busca lugares)
Ele toca as pessoas.
Algumas por um instante, algumas por toda vida
E por todas elas é conduzido
O Passageiro jamais conduz
E tanto as pessoas quanto os lugares não sabem disso…
…é incrível: eles não sabem!
E sempre foi assim!

Todas as viagens são longas
E todos os caminhos diferentes, mesmo os caminhos de volta
…o Passageiro sabe que não existe volta!
Talvez seja isso que sua alma procura
E certamente isso é o que ela nunca vai encontrar!

A esperança do novo lugar é imensa e viva
Mas é na dor do exílio que ele se reconhece
…já faz tempo demais, e é de sua natureza
O exílio de todos os lugares
O exílio de todas as pessoas
E o tempo que concorda com tudo isso
(ele é o único que acompanha o Passageiro;
   sempre singelo, cruel e sempre, sempre sorridente)

O Passageiro fala muitos idiomas
Mas nenhum é compreendido pelos Homens
Por isso ele toca as pessoas
         por um pouco de alimento, pra matar a sede, pra se esconder do frio
Algumas por instantes, outras por toda vida
O tempo é o único que acompanha o Passageiro
E permite que o passado possa ser lido em seus olhos
Mas as pessoas não falam esse idioma
E não olham, não sabem, e não entendem seus olhos
…e a maioria delas não sabe disso
E sempre foi assim!

Mas o Passageiro sabe onde fica a porta de entrada
E sempre se emociona ao contemplar a paisagem…
…as paisagens do tempo passado
   que nunca são as mesmas
   porque não existe caminho de volta!
O Passageiro conhece o futuro
Porque o destino do Passageiro é o exílio
e sempre foi assim!!!


(Montréal, 30 de julho de 2008)