Friday, January 16, 2015

Assassinato

E a manchete dizia o seguinte:
"Oprimido mata Opressor com requintes de crueldade!"
Foi na noite do santo padroeiro
Que a tragédia se deu por inteiro
Assustando a gente daquela cidade

Todos estamos solidários às famílias de ambas as vítimas:
A vítima do assassinato
E a vítima da opressão
Mas só pra primeira teve passeata
Discurso de gente importante
E cobertura na televisão

Pois só a primeira é de fato um crime
Sendo a segunda, fato casual
Que acontece todos os dias
Não vende slogan na camiseta
Nem primeira página de jornal

Ao povo do assassinado

Vítima de uma mente doente
Que se deu o direito de tirar uma vida
Fica a dor, o desespero
E o gosto amargo dessa saudade

Ao povo do assassino

Vítimas duplamente
Da mesma mente doente
E do opressor cruel e consistente
Fica a etiqueta de terroristas
De mensageiros de toda maldade

Enquanto isso nas catedrais

Os assassinos oficiais
Alinham o terno e a gravata 
E vão pra rua em passeata lutar pela liberdade
E tirar foto pro jornal pra depois usar na eleição
Pois oprimir nunca foi crime
E matar de fome e esquecimento
Não merece nossa atenção



(ao atentado de 7 janeiro de 2015 que matou 12 pessoas em Paris, ao atentado de 9 de janeiro que matou mais de 2000 pessoas invisíveis na Nigéria, a à todos os outros que acontecem nas favelas e guetos mundo a fora e matam milhões de outros invisíveis e não são importantes o suficiente pra nos mobilizarmos)






2 comments:

  1. Não dá mais pra segurar!!!!!!!!!!

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  2. Bravo!!!!!! Se superou mon ami, passou por cima de tudo, arrasou, foi além de todos sem, no entanto, deixar de ser poético!
    Mostrou-nos um quadro dantesco, indignado, humano no mais real e profundo da palavra, protestou, revoltou, trouxe à tona, chacoalhou e escancarou a verdade sem deixar a poesia. Lembrou-me grandes nomes....
    E ainda tem quem diga que o que se escreve não vem da alma, que não é a imagem de quem escreveu...

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